quarta-feira, 9 de maio de 2012

Luís Camara Cascudo


O Cirurgião Dentista, de Natal, é quase dos nossos dias. Tivemos o primeiro Médico do Partido Público, em 1842, Dr. José Bento Pereira da Mota e, antes, em 1831, possuíamos um Cirurgião do Partido do Município do Natal, João José de Oliveira, ganhando trezentos mil réis por ano. Não se fala em Dentista. Mas essa “Arte” estava confiada aos Barbeiros.

 Os remédios tradicionais, arruda com leite humano, azeite doce quente, fumar alfazema, cravo esmagado, eram clássicos.

Superiores em eficácia, as orações. Em Augusto Severo, a velha Chica Cardosa rezou, com um raminho verde na mão, “a reza de Santa Pélonha” (Apolônia)

      Pequeno trecho da reza:

"Estava Senhora Santa Pelonha em sua cadeira de ouro sentada com a mão posta no queixo. Passa Nosso Senhor Jesus Cristo. Perguntou: - O que te dói, Pelonha? – Um dente, Senhor! – Pois, Pelonha, do sul ao norte e do nascente ao poente, ficará esta criatura livre e sã e salva de dor de dente, pontada, nevralgia, estalicido e força de sangue. P. N. e A. M., oferecido às cinco chagas de Jesus Cristo."

O Dentista verdadeiramente era um Barbeiro “curioso”. Exerciam esses a profissão, mansa e pacífica, sem concorrência e possível rivalidade.

Ainda em julho de 1888, para 2.748 Médicos, 1.613 Farmacêuticos, matriculados na Inspetoria Geral de Higiene da Corte, havia apenas 329 Dentistas para o Império do Brasil. Nesse mesmo julho de 1888, Natal possuía quinze Médicos e quatro Farmacêuticos. Nenhum Dentista. O Barbeiro continuava, de boticão em punho, fazendo berrar as crianças e sofrer os homens, nas horas amargas da operação.

O Barbeiro-Dentista também aplicava, no sul do Brasil, as sanguessugas e, em toda parte, fazia “sangrias”. Como todas as moléstias dependiam dos “humores” e era a abundância de determinado “humor” a explicação da doença, retirá-lo, pela via sanguínea, pertencia ao domínio da lógica. Sangrar-se era habitual, comum, indispensável. Os indígenas empregavam esse método, usando o Pajé o dente de cotia como lanceta. Ainda alcancei, no velho Natal, de 1908, “Seu Maranhão”, “prático” de Farmácia, sendo chamado para “sangrar”, no pé, correndo o sangue dentro duma bacia, cheia d’água morna, com uma pitada de sal e gotas de vinagre.

Em Natal, anos e anos, o Dentista fazia barbas e aparava cabelos. O antigo “ditado”, verídico e natural, indicando que ao necessitado compete procurar alívio, recorda a fisionomia de uma atividade que o Tempo levou…

A quem dói o dente, vai a casa do Barbeiro…

Nenhum comentário:

Postar um comentário